Moro volta ao palanque
Depois de um ano entre Washington e os bastidores de Brasília, Sérgio Moro filiou-se esta semana ao Podemos voltando ao palanque de onde desceu em abril de 2020, quando deixou o ministério de Jair Bolsonaro. O ex-juiz da Lava Jato mira a coluna do meio da disputa até agora polarizada para a Presidência da República. Mas para ser o favorito da terceira via na disputa com Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-chefe, terá de superar obstáculos como a inexperiência político-partidária, a falta de proposta claras e conflitos entre a bandeira de combate à corrupção, mote inevitável da futura campanha, e processos judiciais contra colegas do Podemos.
Moro tem se dedicado à corrida. Abriu espaço na agenda para treinamentos de oratória e consultas à fonoaudióloga e já colheu alguns frutos. O perfil discreto e a fala pouco envolvente deu lugar a um tom mais firme na cerimônia de filiação. Mas há um longo caminho a percorrer até ter propostas claras e convincentes que poderão livrá-lo das frases feitas. No discurso de quarta-feira (10/11) abusou de clichês como “O Brasil é o país do futuro” ou “Ninguém irá roubar o futuro do povo brasileiro”.
Embora a economia deva ser a grande pauta das eleições (com fome, desemprego e inflação em alta), Moro deve ser o maior interessado em trazer de volta ao palanque o combate à corrupção. A reputação cada vez mais comprometida da Lava Jato ainda é seu principal trunfo. Pena que o brado “Chega de corrupção! Chega de mensalão, de petrolão, chega de rachadinha e chega de orçamento secreto” tenha coincidido com a cobrança do Tribunal de Contas da União de recursos recebidos por procuradores da Lava Jato de forma indevida, segundo a Corte de Contas.
O tema que lhe é tão caro também pode trazer constrangimentos. Partido egresso do PTN (Partido Trabalhista Nacional), refundado em 1995, e inspirado no antigo partido de Jânio Quadros, o Podemos também incorporou, em 2018, o Partido Humanista da Solidariedade (PHS). Tanto PTN quanto PHS são conhecidos pelas práticas fisiológicas e patrimonialistas que resultam em mensalões e rachadinhas. O partido ainda tem de responder acusações de candidaturas femininas laranjas e tem até integrantes investigados pela Lava Jato.
Sem Posto Ipiranga
Moro deve se aproximar de economistas gabaritados para retirar a ansiedade do mercado quanto a seu pensamento econômico e propostas para temas urgentes como inflação e desemprego. Mas será preciso muita dedicação e disposição para aprender já que dificilmente o eleitor voltará a ser condescendente com um presidenciável que admita não entender nada de economia como foi com Bolsonaro.
Em 2018, o debate sobre a corrupção sobrepunha-se ao econômico, o que explica em parte o voto de confiança num candidato que assumia publicamente seu total desconhecimento sobre o tema e transferia toda a responsabilidade para o tutor, o economista e hoje ministro Paulo Guedes.
Também há grande expectativa em relação à política social e as opiniões sobre temas polêmicos como aborto e LGBTQIA+. Um bom posicionamento pode permitir algum avanço sobre o eleitorado mais a esquerda, o que será fundamental para Moro chegar ao segundo turno.
O nome do ex-juiz e ex-ministro de Bolsonaro estará em teste até julho de 2022, quando acontecem as convenções partidárias e as candidaturas serão sacramentadas. Caso não decole, pode acabar disputando o Senado. Essa possibilidade poderia colocá-lo contra o principal entusiasta da sua campanha, o senador Álvaro Dias (Podemos-PR), nono colocado na disputa presidencial de 2018, e que deve tentar a renovação do mandato no próximo ano. Uma segunda alternativa seria tentar a vaga para senador por São Paulo – oferecida pelo governador João Doria.
Generais rachados
A cerimônia de filiação de Moro, no Centro de Convenções de Brasília, contou com a presença de apenas um outro nome da terceira via, seu colega de ministério Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS). Natural quando há apenas uma vaga para oito pretendentes – hoje, ninguém acredita que João Dória e Ciro Gomes abririam mão de suas pretensões em nome de uma candidatura única de centro-direita.
Mas foram as presenças de generais que ajudaram à candidatura Bolsonaro em 2018 que chamaram a atenção. O general Sergio Etchegoyen, ministro do governo Temer, representou o grupo de quatro estrelas que hoje está em oposição à turma que permanece ao lado do presidente da República: os generais Carlos Alberto Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria Geral, Fernando Azevedo e Silva, ex-ministro da Defesa, Maynard Santa Rosa, ex-titular da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), todos do governo Bolsonaro, e Paulo Chagas, ex-candidato ao governo do Distrito Federal.
Seguem com o presidente, Walter Braga Neto, ministro da Defesa, Luiz Eduardo Ramos, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército e assessor especial do GSI.
Cerco ao Centrão
Depois do insucesso ao tentar criar o próprio partido, Aliança pelo Brasil, negociar com o PP e o PTB e cogitar voltar ao PSL, de onde saiu em 2019, Jair Bolsonaro filia-se ao Partido Liberal (PL) na próxima semana. O presidente da República precisa de um partido para disputar a reeleição, mas também para preparar seus sucessores.
A chegada ao partido de Valdemar da Costa Neto – de quem Bolsonaro foi crítico na época do mensalão – tem como estratégica política a aproximação ainda mais sólida com siglas como PSL, Republicanos, Solidariedade, PTB, PSC e PP, além de dissidentes de partidos como PMDB, visando a montagem de palanques estaduais.
De olho no futuro, Bolsonaro não abre mão de lançar o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, ao governo de São Paulo. Como contrapartida, apoiará a reeleição de Arthur Lira (PP/AL) à Presidência da Câmara, em 2023.
Hoje, o PL tem 43 deputados e 4 senadores. A chegada do presidente deve provocar a saída de parlamentares, sobretudo deputados federais do Norte e do Nordeste, como o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (AM). A vinda dos filhos do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (RJ), atual líder do Patriota, e o deputado Eduardo Bolsonaro (Republicanos-SP), não está certa.
Pode ser mais estratégico manter cada integrante da família num dos partidos que formam o Centrão, o bloco que já mereceu o repúdio da primeira-família e que é a melhor tradição do que o presidente costumava chamar de “velha política”.
De volta ao ringue
Depois de suspender a candidatura à Presidência da República em protesto ao apoio de deputados do PDT à PEC dos Precatórios, Ciro Gomes volta à disputa. A posição contrária à proposta não foi unânime, mas houve mudanças de votos, principalmente da bancada cearense, mais ligada ao ex-ministro. No primeiro turno, dos 24 votos do PDT, 15 foram favoráveis e apenas seis contrários. No segundo turno, cinco a favor e 16 contra.
Ciro usou as redes sociais para retomar o tom de campanha e não poupou os principais adversários. Chamou o ex-presidente Lula (PT) de “hipócrita”, Bolsonaro (sem partido) de “oportunista” e Sérgio Moro (Podemos) de “calouro politiqueiro”. Ciro quer ser o nome da terceira via, mas deve fazer voo solo caso não consiga o apoio dos outros pré-candidatos.
Para ficar de olho na semana que vem
– Na explicação que o Palácio do Planalto terá que dar sobre as agressões físicas a jornalistas brasileiros enquanto cobriam a visita do presidente Jair Bolsonaro à Itália. O prazo de 10 dias dado pelo STF termina no início da semana. O tema é caro à imprensa, tanto a mais alinhada quanto a mais distante do governo, e por isso terá grande repercussão.
– No debate que a CNN promove na quarta-feira, às 21h30, com pré-candidatos da terceira via à Presidência da República.
Para ver no feriadão
O perito forense Dexter está de volta esclarecendo crimes durante o dia e cometendo-os à noite com o requinte de quem sabe como não deixar rastros. Dexter: New Blood traz o protagonista tentado esquecer o passado em Miami até que uma sucessão de crimes lhe tira do eixo. No Paramount+.