Como afirma o primeiro-vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), um impeachment, para acontecer, precisa juntar três vertentes. A primeira é a vertente jurídica: deve haver fortes indícios de crime de responsabilidade. Quanto a isso, conforme inúmeros juristas, a longa série de ameaças e de ataques a instituições já seria o bastante para sustentar a tese. A segunda é o apoio da população. Aqui, Bolsonaro tem um trunfo. Embora tenha perdido popularidade, conserva – segundo as pesquisas – o apoio de perto de 25% da população. A terceira vertente diz respeito às condições políticas.
Do ponto de vista formal, estão em questão aí sobretudo os diferentes caminhos que poderiam levar à interrupção do mandato presidencial. Além do impeachment, eles incluem o afastamento para responder a investigações criminais, que depende de autorização da Câmara, e a cassação da chapa Bolsonaro/Mourão pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A ação julga abuso de poder econômico e ação indevida das redes sociais diante da denúncia de uso de robôs e fake news financiado por grupos de empresários.
Na hipótese de cassação da chapa, o que a Constituição prevê é a realização de uma eleição indireta, pelo Congresso Nacional, para a eleição de um presidente provisório que exerceria um mandato-tampão até a eleição de 2022. De acordo com um deputado, tenta-se atrair o presidente da Câmara para essa estratégia. Primeiro, ela tiraria dele o peso da responsabilidade de colocar em discussão um dos processos de impeachment. Segundo, daria ao próprio Lira uma chance concreta de ser eleito para esse mandato provisório pela força que tem na Câmara dos Deputados. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), é outro nome com força nessa solução congressual.
Mas o fator determinante é algo que ainda não apareceu: um nome alternativo ao de Bolsonaro, com capacidade para derrotar o ex-presidente Lula (PT). As pesquisas indicam que perto de 40% dos eleitores não querem eleger nenhum deles. Mas nenhum outro pré-candidato, além de Bolsonaro e Lula, dá sinais de real força eleitoral. Ciro Gomes (PDT) aspira ser esse nome, mas dificilmente seria apoiado pelos setores empresariais que mantêm os laços com o atual presidente da República por o verem como um “mal menor” diante do risco da volta do PT ao poder.
João Doria, tido como favorito para ganhar a indicação do PSDB, precisa derrotar antes nas prévias o governador gaúcho Eduardo Leite. Mas também tem um sério passivo a saldar. O seu calcanhar de Aquiles, que contribui para o baixo índice que tem obtido em sondagens eleitorais, é o fato de ter cultivado a imagem de pouco confiável após abandonar os dois políticos que mais contribuíram para a sua ascensão: o próprio Bolsonaro, com o qual fez dobradinha em 2018, e Geraldo Alckmin, patrono da sua candidatura a prefeito de São Paulo.
Quem mais poderia enfrentar Lula com chances de vitória em um eventual segundo turno? E como chegar lá com a fidelidade demonstrada até aqui ao atual presidente por boa parte do eleitorado bolsonarista? São perguntas até agora sem resposta, o que aumenta o cacife de Arthur Lira para segurar o processo de impeachment.
Para Marcelo Ramos, Bolsonaro “isolou-se completamente e empurrou alguns partidos, como PSDB, MDB, Solidariedade e Cidadania para o impeachment”. Mas, completa, isso não significa dizer que o impeachment ficou próximo: “Vamos falar de menos distante. Ele ainda tem força nas ruas e no Parlamento. Vamos aguardar as consequências dessa trapalhada patética do Sete de Setembro”.
Congresso em Foco