
Há uma sombra sobre os 171 deputados e 17 senadores que, a despeito da decisão do Supremo Tribunal Federal, mantêm sob sigilo o valor recebido do Orçamento secreto, mecanismo usado pelo presidente Jair Bolsonaro para angariar apoio do Congresso Nacional. Apenas 342 deputados e 64 senadores decidiram se manifestar e entregaram ofício ao STF informando os valores recebidos – alguns informaram não ter recebido nada. A ministra Rosa Weber aguarda desde março essas informações, mas os esclarecimentos, além de chegarem incompletos, ainda demoraram dois meses para ser entregues.
O Orçamento Secreto atenta contra a transparência. Além de não ter regras claras, é liberado por critérios subjetivos, dando prioridade a parlamentares da base de apoio ao governo. Foi essa justificativa que levou o tema ao Judiciário que, por ora, liberou o pagamento, mas ainda está atrás de explicações. Foram separados R$ 16,5 bilhões para pagar obras em redutos eleitorais nas áreas de saúde, educação e infraestrutura. Mas não há garantias de que a finalidade foi mesmo essa.
Mesmo na oposição, políticos do PT, PDT e PSB conseguiram R$ 156,1 milhões do esquema, numa negociação para eleger Rodrigo Pacheco (PSD/MG) presidente do Congresso. Ao todo, 23 parlamentares do PT, PSB, PDT, Rede e PCdoB disseram que não receberam.
O relator do Orçamento, senador Márcio Bittar (União/AC) e a senadora Eliane Nogueira (PP/PI), mãe e suplente do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, foram os campeões de indicações das emendas RP9: R$ 460 milhões e R$ 399,2 milhões, respectivamente.
Jogo de cena

Sob nova direção, o Ministério de Minas e Energia pretende examinar com lupa a política de preços da Petrobras. O novo ministro, Adolfo Sachsida, terá a missão de parecer fazer aquilo que o antecessor, Bento Albuquerque, não conseguiu: evitar o reajuste dos preços dos combustíveis. Mas ao assumir o cargo, Sachsida priorizou na sua fala o início de modelagem para a privatização da Petrobras. A contradição está posta. Se o governo não consegue controlar os preços dos combustíveis com a Petrobras sob controle estatal, como faria depois da venda do controle da companhia?
Qualquer que seja a resposta, a fala do novo ministro tem mais efeito político do que prático. A privatização da Petrobras é um tabu para boa parte dos eleitores e poderia trazer prejuízos eleitorais ainda maiores do que os aumentos frequentes da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. O histórico do governo, que não conseguiu privatizar nenhuma grande estatal nos últimos três anos, também não recomenda apostas na venda do controle da empresa. Sachsida tem perfil liberal e é uma indicação do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Bolsonaro trata a Petrobras com desdém. Em um ano promoveu duas trocas na presidência da companhia. Nesta semana, disse que a empresa é “gordíssima e obesa”, referindo-se ao lucro líquido do primeiro trimestre, de R$ 44,6 bilhões. Os cofres da empresa estão cheios porque o preço dos combustíveis segue o mercado internacional. Uma alternativa para derrubar os preços nos postos é a União abrir mão da gorda fatia que recebe dos lucros, solução que pode ser anunciada às vésperas das eleições.
Perdão e bolso cheio

Ocupando 6 mil cargos comissionados no governo federal, os militares tornaram-se peças-chave do projeto político de Bolsonaro. Recém-inocentado pela Justiça pela falta de oxigênio no Amazonas, em 2021, quando pelo menos 30 pessoas morreram por asfixia, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello vai coordenar o programa de governo da campanha à reeleição do presidente da República.
A dedicação tem sido recompensada. Uma portaria editada pelo próprio Bolsonaro em abril do ano passado permite que militares da reserva com cargos no governo – 43 no total – possam acumular salários e aposentadorias acima do teto constitucional, de R$ 39,3 mil. A mudança permitiu gordos salários ao próprio Bolsonaro, ao vice-presidente, Hamilton Mourão, e aos ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), além de Braga Netto, ex-ministro da Defesa, cotado para ser candidato a vice na chapa de Bolsonaro.
A nova regra permitiu a Ramos acumular R$ 350,7 mil além do teto constitucional nos últimos doze meses. Heleno embolsou mais R$ 342 mil; Mourão, R$ 318 mil; e Braga Neto, R$ 306 mil. Os valores se referem ao período de 12 meses e foram revelados pela “Folha de São Paulo”.
Resta uma

Embora desidratado, o Centro Democrático resiste e, ao que tudo indica, terá a senadora Simone Tebet (MDB) como candidata à Presidência da República. O grupo perdeu o apoio do União Brasil, que optou por voo solo e lançou o presidente do partido Luciano Bivar, ainda sem pontuar nas pesquisas eleitorais. Mesmo assim, MDB, PSDB e Cidadania pretendem oficializar o nome na quarta-feira (18), como era o plano inicial da antes conhecida Terceira Via.
A escolha de Tebet foi pactuada a partir de critérios que praticamente eliminaram João Doria (PSDB) na disputa. Embora mais bem colocado nas pesquisas, com até 3% de intenções de votos, o tucano perde no outro critério: rejeição. O Centro Democrático acredita que a senadora terá mais apelo eleitoral na tentativa de competir com a polarização cada vez mais consolidada entre Jair Bolsonaro (PL) e Lula (PT).
Enquanto isso, Lula tenta colocar Geraldo Alckmin (PSB) como principal interlocutor de dissidentes do Centrão. Para isso, o núcleo da campanha quer fora das discussões temas polêmicos como regulamentação da mídia e aborto.
Terceiro colocado nas pesquisas, Ciro Gomes (PDT) pediu união de candidatos contra a tentativa do presidente de atuar contra a eleição. “Ou a sociedade e as lideranças políticas tomam providências já, ou chegaremos a um ponto sem retorno”, declarou. A fala foi interpretada como uma sinalização de apoio ao voto útil, ou seja, que eleitores de Ciro possam desembarcar da candidatura já no primeiro turno, em favor de Lula. Ele nega, mas já há movimentação de diretórios do PDT neste sentido.