
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, está na berlinda, mas é pequeno o risco de ser demitido. A denúncia de favorecimento a pastores pesa menos do que as relações com as boas relações com a primeira-dama, Michele Bolsonaro, o filho 01, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), e o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal. Por isso, Jair Bolsonaro decidiu aguardar a repercussão, sobretudo entre os evangélicos que compõem sua base eleitoral. A princípio, o episódio foi até bem avaliado, por demonstrar que o ministro dedica-se a atender aliados.
Ribeiro foi flagrado atendendo demandas de prefeituras intermediadas pelos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, ligados à Assembleia de Deus. Mesmo sem ter cargo no governo, os dois conseguiram liberação de dinheiro em tempo recorde, numa espécie de gabinete paralelo. Prefeitos disseram que há pedidos inusitados de propina para ter o pedido de recurso público priorizado, como 1kg de ouro e até compra de bíblias. Em áudio publicado pela Folha de S. Paulo na terça-feira (22/3), o ministro da Educação disse que atendeu os pastores a pedido de Bolsonaro.
Depois do flagra, Ribeiro tentou livrar o presidente e disse que a liberação de recursos atendeu a critérios técnicos. Mas a fala não convenceu nem integrantes da Bancada Evangélica. O ministro foi chamado a se explicar ao Senado na semana que vem. O desempenho e, acima de tudo, o desgaste eleitoral que a audiência pode gerar, será determinante para sua permanência no cargo.
Há ainda um pedido de CPI e de impeachment do ministro. Ribeiro também será investigado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público Federal (MPF). Não será uma experiência nova. Ele já foi denunciado por homofobia ao associar adolescentes homossexuais a “famílias desajustadas”.
Desde o início do governo Bolsonaro, o Ministério da Educação foi usado para abrigar representantes da ala conservadora. Ricardo Vélez Rodríguez ocupou o cargo por três meses, mas saiu por não conseguir comprovar a titulação do currículo. Foi substituído por Abraham Weintraub, demitido quando era alvo de investigação por ataques ao STF e acusação de racismo contra chineses.
Religião e política

O escândalo no Ministério da Educação demonstra que, na política, o artigo da Constituição que denomina o Brasil como um país laico é relativo. A denúncia de que o ministro Milton Ribeiro dava prioridade a pedido de verbas de dois pastores evangélicos colocou em evidência a influência da igreja na atividade política. No Congresso Nacional, a pauta conservadora – contra o aborto, liberação das drogas e ideologia de gênero, por exemplo – é capitaneada pela Frente Parlamentar Evangélica, bancada formada por 115 deputados e 13 senadores, em torno de 20% da composição. Se não é a mais numerosa, é uma das mais relevantes. Foi por iniciativa do grupo que foi aprovado o Estatuto da Família, que dizia que a família é formada apenas por homem e mulher.
Aliás, em qualquer eleição, o voto evangélico é alvo de disputa. Participar de cultos e visitar igrejas estão no roteiro de qualquer candidato. A profusão de políticos que coloca a fé como bandeira e como razão para angariar votos dos fiéis não é um fenômeno novo. Em 1961, Levy Gonçalves Tavares (PSD/SP) foi o primeiro deputado federal eleito com as bênçãos da igreja Brasil para Cristo. Com a Assembleia Constituinte, os movimentos religiosos se organizaram para ter pelo menos um candidato por Estado. Atualmente, a Igreja Universal do Reino de Deus, de Edir Macedo, concentra a maioria dos representantes no parlamento. A congregação neopentecostal comanda o partido Republicanos, fundado em 2003 – antes era Partido Republicano Brasileiro (PRB). É o 10º maior em número de filiados no Brasil, 490 mil.
Unir a alcunha de “Pastor”, “Bispo”, “Padre” ao nome nas urnas funciona como estratégia para se tornar um puxador de votos. Candidatos com papel de lideranças religiosas foram 568 nas eleições de 2018.
Milton Ribeiro não tem experiência com educação e chegou ao cargo por ser líder de uma igreja presbiteriana em Santos (SP). Mas não é um caso isolado. No governo Dilma Rousseff, Marcelo Crivella, bispo da Igreja Universal, foi ministro da Pesca. No governo Michel Temer, o pastor Marcos Pereira, bispo da Universal, foi ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Bolsonaro, que se considera um cristão e usa o bordão “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, foi além e colocou André Mendonça como ministro “terrivelmente evangélico” no Supremo Tribunal Federal (STF).
Cadeiras ocupadas

A menos que haja surpresa, Geraldo Alckmin, filiado ao PSB esta semana, e o general Braga Netto – com filiação ao PL prevista para domingo (27/3) – serão candidatos a vice-presidente de Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL), mas assumem a missão com papéis distintos. Alckmin usou o ato de filiação para mandar recados a alas do PT mais resistentes ao seu nome e fez questão de acenar para um projeto de país. “O presidente Lula é hoje o que melhor reflete e interpreta o sentimento de esperança do povo brasileiro. Ele representa a própria democracia”, afirmou o ex-tucano. O gesto foi interpretado como a “Carta ao Povo Brasileiro de 2022”, recurso usado pelo petista na campanha de 2002 para minimizar a desconfiança de grupos empresariais e adversários sobre seu primeiro governo. Na função, Alckmin tomará a frente da discussão com grupos conservadores, bolsonaristas e do Centrão.
O general Braga Netto, por sua vez, terá uma função mais decorativa. Trará o respaldo das Forças Armadas, mas se espera que o poder não o faça comentar assuntos desalinhados do governo – essa a principal crítica feita à postura do general Hamilton Mourão no cargo. Discrição e lealdade estarão no topo da lista de desejos.
Na tentativa de romper a polarização, Simone Tebet (MS), pré-candidata pelo MDB, assumiu o controle do chamado “Centro Democrático”. A senadora quer intensificar as conversas com o União Brasil, com João Doria (PSDB) e Sérgio Moro (Podemos). Mas não quer ouvir falar na possibilidade de ser vice. Além de construir uma aliança para um candidato único da terceira via, Tebet acredita que por ser mulher, ter a menor rejeição e ser de um partido capilarizado pode se colocar à frente dos demais. A costura mais difícil, no entanto, será convencer Doria e Moro a desistir, disputar outro cargo ou até mesmo ficar fora da disputa.
Nova fórmula

A ameaça de suspensão do Telegram – que acabou não se efetivando após o aplicativo se comprometer com mudanças – impõe um marco de tolerância zero a disparos em massa de mensagens, grupos que cometem crimes – inclusive não somente eleitorais – e, mais do que isso, a divulgação de notícias falsas. O Judiciário, sobretudo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), promete uma atuação implacável. O papel estratégico das redes sociais nas campanhas eleitoral terá como elemento novo a responsabilidade dos candidatos e das plataformas online.
Segundo a legislação eleitoral, candidatos, partidos políticos e apoiadores responsáveis pela prática estão sujeitos a pena de multa e a 1 ano de prisão. As fake news, por sinal, estão sendo combatidas, por iniciativas inéditas. O Youtube, por exemplo, removeu vídeos sobre as alegações falsas de fraudes nas eleições de 2018. A decisão deve afetar lives do presidente Jair Bolsonaro que apontavam que as urnas eletrônicas foram fraudadas – suspeita jamais comprovada e que provocou a abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal.
O TSE fechou acordo com Twitter, TikTok, Facebook, WhatsApp, Google, Instagram, YouTube e Kwai para disciplinar um uso saudável das ferramentas no processo eleitoral. O compromisso, inclusive, prevê a retirada de conteúdos imediatamente em caso de violação das regras. O Telegram nomeou um representante no Brasil, como prevê a legislação brasileira, mas ainda não assinou nenhum compromisso com a Justiça Eleitoral.