
A pesquisa Datafolha divulgada na noite de ontem (26/5) com o ex-presidente Lula (PT) abrindo 21 pontos de vantagem sobre o atual presidente, deve fazer Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores reforçarem o discurso contra o sistema eleitoral, em geral, e as urnas eletrônicas, em particular. Na estratégia do Palácio do Planalto, é preciso manter o processo eleitoral sob suspeita, o que inclui as pesquisas de intenção de voto, para justificar eventual reação a resultado diferente do pretendido pelo presidente, a sua reeleição.
Há método – e uma aposta na ignorância do eleitor – no processo de descrédito. Dois dias antes da pesquisa, o cantor e ex-deputado Sérgio Reis (PL-SP) disse em entrevista à Folha de São Paulo que Bolsonaro só não será reeleito no primeiro turno “se roubarem”. Depois do resultado, os ministros das Comunicações, Fábio Faria (PSD-RN), e da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), tentaram desqualificar o Instituto Datafolha, sem o efeito esperado. Faria foi contestado por adversários que expuseram uma publicação anterior em que o ministro dava crédito a uma pesquisa do mesmo Datafolha que mostrava melhora na avaliação do seu chefe.
Pesquisas qualitativas encomendadas pelo Palácio do Planalto revelam que Bolsonaro se desgasta ao confrontar outras instituições. Mas a estratégia palaciana deve ser mantida, exigindo cada vez mais firmeza dos ministros do Supremo Tribunal Federal e, particularmente, de Edson Fachin e Alexandre de Moraes. Atual e próximo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – Moraes assume a presidência da Corte eleitoral em agosto e é relator de processos em que Bolsonaro é investigado – os dois são alvos quase diários do presidente da República, de seus filhos e de apoiadores.
Os ministros têm o desafio de fazer a defesa da Justiça e do sistema eleitoral diariamente no tom certo. As reações não podem dar razão ao discurso do presidente da República e do seu entorno, não podem reforçar o discurso do Planalto de que o sistema é falho e foi feito para beneficiar um ou outro. A quatro meses do primeiro turno e ainda longe do auge da disputa, esse não é um desafio desprezível.
O próximo momento de tensão será a live semanal do presidente. A de ontem, foi cancelada pouco antes de ir ao ar e, coincidentemente, pouco depois da divulgação da pesquisa. É esperar o que Bolsonaro vai dizer sobre os números do Datafolha.
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Voto espontâneo X Rejeição

Além da vantagem na pesquisa estimulada de intenção de voto (Lula 48; Bolsonaro 27; Ciro Gomes 7%), a última pesquisa Datafolha mostra Lula 8 pontos percentuais a frente do atual presidente na pesquisa espontânea (em que não se apresenta o nome de nenhum candidato ao entrevistado e costuma indicar um voto mais cristalizado).
Conhecido por 98% dos entrevistados, Bolsonaro lidera a rejeição, segundo o Datafolha: 54% dos entrevistados disseram que não votam no presidente de jeito nenhum. Eram 55% na pesquisa anterior, feita em março. A rejeição a Lula é de 33%, quatro pontos percentuais a menos do que em março. O ex-presidente tem o maior índice de conhecimento: 99%.
A candidata da chamada Terceira Via, a senadora Simone Tebet (MDB) tem 2% de intenção de voto e 9% de rejeição. Como é conhecida de apenas 29% do eleitorado, esses índices podem mudar a medida em que a pré-candidata fique mais exposta. Ciro Gomes (PDT) é conhecido por 91% dos entrevistados, tem 7% de intenção de votos e 19% de rejeição.
Paredão

A Constituição garante o livre trânsito a todo cidadão brasileiro. Mas o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, guardião-mor da Carta, foi barrado duas vezes na mesma semana. Convidado para uma palestra sobre “Risco Brasil e Segurança Jurídica”, em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, promovida pelo Centro da Indústria, Comércio e Serviços (CIC), o magistrado foi desconvidado por pressão de setores do empresariado que apoiam o presidente Jair Bolsonaro. A entidade, uma das mais ricas e poderosas do Rio Grande do Sul, disse em nota que não tinha como garantir a segurança de Fux.
A subseção da OAB de Bento Gonçalves, então, encampou a palestra e manteve o convite para o dia 3 de junho próximo. Mas também teve de recuar por pressão do mesmo grupo. Antes de suspender o evento ainda tentou argumentar que “a democracia é feita pelo diálogo, a oportunidade de ouvir e ser ouvido, bem como de termos o representante máximo do Judiciário” na cidade. A resistência durou pouco. No mesmo dia, a entidade capitulou.
Na tribuna do Senado, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) viu os cancelamentos como “reflexo da indisposição crescente da população gerada pela série de atitudes controversas da Suprema Corte”. Entre essas atitudes, o senador citou a decisão do juiz Charles Renaud Frazão de Morais, da 2ª Vara Federal em Brasília, de aceitar ação popular movida por deputados do PT contra o ex-juiz Sergio Moro, a quem acusam de de ter causado prejuízos financeiros à Petrobras pela atuação na Lava Jato.
O STF não se manifestou sobre os cancelamentos.