
A fala do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, durante a rotineira coletiva de atualização de dados sobre o coronavírus, foi a mais esperada no dia de hoje (25/3). Ele se preparou para garantir um tom calmo, com a segurança de quem é médico; técnico sempre que possível; cordial; e conciliador, principalmente ao propor diálogo com os governadores.
O ministro da Saúde, que passou o dia com o cargo em xeque, usou frases como: “Estamos aqui”, “O Ministério da Saúde está ao lado da população”, “O governo está firme”, “A vida continua”.
Segundo Mandetta, a maior contribuição do pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro, ontem, foi alertar sobre problemas na economia. Disse ele, de forma coloquial e muito à vontade: “Até mesmo porque a ficha da população demorou a cair”, os governadores acabaram tomando atitudes assimétricas”.
As quarentenas teriam sido decretadas antecipadamente, sem um prazo para terminar, o que teria deixado dúvidas e colocado em risco o dia a dia das pessoas. Para contornar o problema, o ministro se propôs a discutir com cada governador a situação dos estados e ajudar a encontrar soluções caso a caso.
A atitude conciliatória era mais do que necessária depois do rompimento do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), com o presidente da República; e de desentendimentos públicos de Jair Bolsonaro com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).
Quem é ele? A hora e a vez de Mandetta

É na adversidade que o homem público tem oportunidade para crescer e exercitar sua força. Na crise, como se diz por aí, ou vai ou racha. Vinte e nove dias depois da confirmação do primeiro caso de coronavírus no Brasil, chegou o momento de Luiz Henrique Mandetta (DEM/MS) se apresentar para toda a nação. No governo, ele andava quieto, trabalhando sem aparecer, evitando estardalhaços. Até que o coronavírus o obrigou a ir para o front.
Ortopedista, 54 anos, natural de Campo Grande (MS), Mandetta era um parlamentar ativo na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados. Mais do que isso, foi o idealizador da Frente Parlamentar da Medicina e defendeu veementemente que os médicos aprendessem a sair dos consultórios para discutir política e influenciar a atividade legislativa. O objetivo: evitar que projetos sem pé nem cabeça passassem no Congresso Nacional.
Influências e influenciados
Para criar a bancada dos médicos, estudou a fundo o modelo da Frente Parlamentar da Agropecuária, que recebe apoio técnico do Instituto Pensar Agro (IPA), sustentado por cerca de 50 associações da agropecuária. Foi sempre muito próximo ao ruralista e atual governador de Goiás, Ronaldo Caiado, responsável por sua indicação ao Ministério da Saúde.
A frente idealizada por Mandetta ganhou corpo. Hoje, para fazer relações governamentais no Congresso, quem atua no setor de saúde tem duas grandes frentes a engajar: a tradicional Frente Parlamentar da Saúde e a Frente Parlamentar da Medicina. Não é por acaso que em pesquisas como o Painel do Poder, da In Press Oficina em parceria com o Congresso em Foco, ele sempre aparece como um dos ministros mais bem articulados nas duas Casas do Congresso Nacional.
O ministro Saúde é primo do senador Nelsinho Trad (PTB/MS), que contraiu a covid-19 e chegou a ir pra UTI; do deputado federal Fábio Trad (PSD/MS); do prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD); e do vereador da capital sulmatogrossense, Paulo Siufi Neto (MDB).
Integra o grupo político da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que assim como ele é uma liderança do DEM no Mato Grosso do Sul e expoente da bancada do Agronegócio.
Mandetta já esteve em xeque outras vezes
No ano passado, havia notícias de que o presidente Jair Bolsonaro estaria descontente não apenas com o perfil discreto de Mandetta, que evita as polêmicas encampadas pelo governo, mas também pelo fato de o partido do ministro, o DEM, flertar com prováveis adversários do presidente em 2022.
Já houve boatos de que Luiz Henrique Mandetta poderia ser substituído pelo ex-ministro Osmar Terra, atual líder do governo, ou pelo médico gaúcho Alberto Beltrame, presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass).
Como pensa o DEM
Lideranças do Democratas temiam que Luiz Henrique Mandetta colocasse sua honra de médico a prêmio caso endossasse a fala do presidente da República. A orientação seria seguir firme com as orientações técnicas. O ministro parece ter encontrado o caminho do meio.
Discurso de Bolsonaro movimenta as redes sociais



Até 16h56 de hoje, quando começou a coletiva do Ministério da Saúde, o ministro Mandetta manteve-se distante do debate público. Deixou espaço livre para a sociedade discutir se era adequada ou não a fala do presidente Jair Bolsonaro na noite de ontem.
Em resposta à comparação feita por Bolsoonavírus seria uma “gripezinha”, o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, alertou: “Em muitos países, as UTIs estão lotadas e essa é uma doença muito séria”.
Nas redes sociais, uma movimentação no Twitter colocou a hashtag #BolsonaroTemRazao em primeiro lugar nos trending topics (assuntos mais falados na rede) por mais de seis horas, com pelo menos 472 mil tuítes sobre o tema. Os usuários se revezaram entre apoiadores e críticos do posicionamento do presidente.
Aqueles que se manifestaram a favor do discurso de Bolsonaro defenderam um isolamento vertical, ou seja, isolar o grupo de risco enquanto o resto da população segue trabalhando. Só nesta quarta-feira foram identificadas quase duas mil menções ao termo, a maioria no Twitter (66%), seguido do Facebook (33%) e YouTube (1%).
No Facebook, o site UOL trouxe a repercussão do discurso de Bolsonaro e afirmou que o presidente “chocou, além de boa parte da sociedade, médicos e entidades de saúde, já que as recomendações dele foram contrárias ao que os especialistas vêm dizendo há semanas”, o que inclui a indicação de isolamento vertical. Já o Estadão informou, no Twitter, que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, não vai aceitar o sugerido por Bolsonaro.
Outra hashtag que compôs o ranking do Twitter na manhã de hoje foi #BolsonaroEnlouqueceu, com opiniões de usuários que discordam do presidente do Brasil. Foram identificados cerca de 26,8 mil tuítes, uma diferença de 94% em relação a #BolsonaroTemRazao.


Tabuleiro de xadrez 2022

Início de disputa eleitoral ou não, analistas políticos chamam a atenção para como o tabuleiro de xadrez de 2022 começa a se movimentar. Peças desse jogo de força e estratégia saem da caixa para ocupar lugares de fala. Não à toa, antes do cancelamento do pronunciamento do presidente pela manhã, o governador de São Paulo, João Doria disse que suspenderia a entrevista coletiva que estava dando para… voltar depois. Claramente, queria ter a última palavra.
Aliás, o clima tenso na reunião dos governadores do Sudeste com o presidente da República, Jair Bolsonaro, alimentou o discurso e dando corda a Doria. Junto aos repórteres, ele assumiu tom ao mesmo tempo religioso, professoral e crítico. Dirigiu-se a Bolsonaro: “Pense nisso, presidente, lidere seu país, lidere o seu povo com alma aberta, com coração aberto, fazendo o bem às pessoas. E não transforme isso numa conflagração, numa luta política e numa disputa eleitoral”
A frase
“A posição do nosso governo é uma só: o isolamento e o distanciamento social.”
General Hamilton Mourão, vice-presidente da República
Coronavírus em números
