A possibilidade de revogação da PEC da Bengala engatilhou o novo campo de batalha do Congresso com o Supremo Tribunal Federal. Mas a troca de tiros, pelo menos por enquanto, terá como escudo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL). Liderada pela fiel aliada bolsonarista Bia Kicis (PSL/DF), a Comissão de Constituição e Justiça aprovou a proposta que, se aprovada, daria a possibilidade de o presidente Jair Bolsonaro indicar mais dois ministros da Corte. O texto volta a fixar em 70 anos a idade para a aposentadoria compulsória dos servidores públicos.
A idade limite, desde 2015, é de 75 anos, decisão também com tons casuísticos. Na época, foi justificada como uma adaptação à nova expectativa de vida dos brasileiros, mas – na verdade – foi feita para impedir a então presidente Dilma Rousseff de fazer novas nomeações. Hoje com 73 anos, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski seriam obrigados a se aposentar. Mas a interpretação não é consenso.
Embora preveja uma saída imediata dos ocupantes de cargos públicos com mais de 70 anos, a PEC pode ser questionada no STF. Há o entendimento de que uma lei não pode retroagir para prejudicar. Ou seja, na prática a nova regra só valeria para quem assumisse cargos públicos pós promulgação da emenda.
Apesar do aval da CCJ, Lira anunciou que não levará essa proposta para o plenário.
O gesto é interpretado como um recado aos ministros do STF em represália à paralisação do Orçamento Secreto, como foram batizada as emendas de relator que são pagas livremente aos parlamentares favoráveis ao governo.
A sirene pode ter tocado como aviso, mas o disparo da bomba ainda vai aguardar.
Sabatina evangélica
O presidente Jair Bolsonaro até agora já indicou Kássio Nunes Marques, que tomou posse em novembro do ano passado, e aguarda a sabatina do segundo indicado, André Mendonça, que espera desde julho o aval do Senado para assumir. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça, David Alcolumbre (DEM/AP), resistiu, mas fechou um acordo com a bancada evangélica e marcou a sabatina a próxima semana. O mais provável é que seja em 30 de novembro, justamente o Dia do Evangélico. Mendonça tem o perfil “terrivelmente evangélico” prometido por Bolsonaro aos correligionários. Ele é pastor da Igreja Presbiteriana Esperança.
Para se tornar ministro, são necessários 41 dos 81 votos no plenário – número que é considerado uma incógnita, sobretudo por se tratar de votação em sessão secreta. Se aprovado, Mendonça substituirá o ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou em 12 de julho, e herdará 1,6 mil processos.
A rejeição seria a sexta da história. Em 1894, governo do marechal Floriano Peixoto indicou onze nomes para o STF – cinco rejeitados pelo Senado. O mais emblemático foi de Cândido Barata Ribeiro. O médico baiano chegou a atuar por 10 meses, mas quando o caso foi analisado pelos senadores, foi rejeitado. O motivo? A falta de “notável saber jurídico”.
Na cova dos leões
De olho na vaga no caso de rejeição de André Mendonça, o procurador-geral da República, Augusto Aras, tem uma incoveniente decisão pela que pode enfraquecer o sonho de virar ministro do STF. No sábado (27/11), Aras promete anunciar a decisão sobre a abertura do inquérito para apurar os 9 crimes atribuídos a Bolsonaro pela CPI da Covid. Neste caso, o presidente passaria a ser investigado formalmente por prevaricação; charlatanismo; epidemia com resultado morte; infração a medidas sanitárias preventivas; emprego irregular de verba pública; incitação ao crime; falsificação de documentos particulares; crime de responsabilidade e crimes contra a humanidade. Ao todo, 78 pessoas e duas empresas foram indiciadas.
A decisão favorável à abertura de inquérito vai atingir todos os acusados com foro privilegiados, entre eles, Marcelo Queiroga, ministro da Saúde; Wagner de Campos Rosário, ministro da CGU (Controladoria Geral da União); Braga Netto, ministro da Defesa; o senador Flávio Bolsonaro (Patriota/RJ); o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL/SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos/RJ).
Pecado da palavra
Durante a campanha presidencial, Bolsonaro chegou a sugerir que a Corte tivesse 21 ministros – 10 a mais do que a composição definida em 1890, quando o STF foi criado.
Curiosamente, na época, ele dizia ser necessário colocar mais 10 com o “perfil de Sérgio Moro”. “É uma maneira de você botar 10 isentos lá dentro”, conclamava. Moro hoje é pré-candidato à presidência da República pelo Podemos. Rompeu com Bolsonaro em abril de 2020, após 1 anos e 4 meses como ministro da Justiça, e surge como principal nome da terceira via. Um adversário, inclusive, que disputa o mesmo nicho do eleitorado.
A tentativa de mudar a composição do STF, contudo, ainda resiste. A deputada Bia Kicis desengavetou, em setembro, a PEC 275, de 2013, que amplia para 15 o número de ministros, mas coloca a nomeação sob responsabilidade do Congresso, a partir de listas tríplices enviadas pelo Conselho Nacional de Justiça, Conselho Nacional do Ministério Público e Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. O texto está sob relatoria do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL/SP), também aliado de Bolsonaro.
Para ficar de olho na semana que vem
- Filiação do presidente Jair Bolsonaro ao PL na terça, em cerimônia em Brasília
- Discussão e votação da PEC dos Precatórios no Senado, com mudanças no texto
- Votação do projeto que pretende revogar a Lei do Desarmamento
- 2ª Turma do STF julga, na terça-feira, ações que podem arquivar acusação contra Flávio Bolsonaro no caso das rachadinhas.
Para ver no fim de semana
O livro ‘Amoroso: Uma biografia de João Gilberto’, lançado nesta quinta-feira (25/11), é uma oportunidade de conhecer em detalhes, a vida a obra e os bastidores do pai da Bossa Nova e um dos maiores músicos da história, morto em 2019 aos 87 anos. O autor Zuza Homem de Mello demorou 20 anos para concluir a obra, literalmente a última dele. O produtor musical, jornalista e escritor faleceu quatro dias depois de colocar o ponto final na publicação de 328 páginas.